O arquiteto Gustavo Calazans e o especialista em mobiliário vintage Téo Vilela, da Loja Téo, tiveram a experiência que muitas pessoas têm em sua lista de desejos: conhecer o dinamarquês Noma, em Copenhague, considerado o melhor restaurante do mundo. Calazans conta aqui, desde a reserva até o prato final como foi essa imersão na gastronomia – e na antropologia – para a dupla.
“ Desde que planejamos ir pra Copenhage nos veio a ideia de visitar o Noma. Meio inevitável pra duas pessoas que valorizam a qualidade das coisas querer passar por essa experiência e entender – ou tentar entender – o que faz de um restaurante o número um do mundo. Mas, como vários desejos nessa vida, tivemos que nos resignar, porque conseguir um mesa era uma tarefa impossível. Eis que, dois dias antes de chegarmos à cidade, recebo uma ligação. Estávamos na Noruega, em Oslo, quando o celular tocou. Do outro lado da linha, uma simpática pessoa me diz que um cancelamento de última hora tinha acabado por nos disponibilizar a nossa tão desejada mesa.
Primeira dúvida: como os comensais do Noma se vestem? Perguntei na recepção do nosso hotel, e eles nos aconselharam a usar pelo menos um blazer. O engraçado é que, ao chegarmos, vimos que havia todo tipo de pessoas e vestidas de forma super casual: despojados americanos de jeans e camiseta, uma elegante família japonesa, um grupo mais barulhento e à vontade. Ao nosso lado, um casal de indianos com vários filhos. Eles eram de San Francsico, Califórnia. Soubemos na hora das fotos, claro. Já na porta, eles tiraram a nossa foto e nós, a deles.
O Noma fica no térreo de um antigo edifício à beira-mar, que provavelmente foi usado como galpão de armazenamento. O piso é de madeira acinzentada, teto não muito alto, estrutura de madeira aparente na mesma tonalidade do piso. Há poucas e espaçadas mesas e as pessoas chegam com um pequeno intervalo entre umas e outras. O motivo se explica: há um menu fixo de 20 pratos, todos muito elaborados, e os chefs responsáveis por prepará-los é quem vêm nos explicar as iguarias que estão sendo servidas.
Nossa simpática atendente nos apresenta a proposta do restaurante e nos serve as bebidas, mas dali em diante virão à nossa mesa um staff enorme de cozinheiros que trazem suas pequenas obras de arte. Tudo é lindo e interessante, e a apresentação, bem criativa. Por exemplo, dentro de uma réplica de ovo de cerâmica havia uma palhinha, como um ninho, e sobre ela um pequeno ovo cozido, daqueles de cozimento perfeito e gema calculadamente mole.
Fomos recebendo, um atrás do outro, os 20 pratos que sempre tinham algo de muito exótico, seja nos ingredientes, seja no modo de preparo. Alguns ficaram registrados na memória, como as torradas com finíssimas lâminas de fígado de bacalhau congelado. O prato vinha com uma orientação: “comam rápido!” E teve a sopa servida dentro de uma cabaça de abóbora local com canudinho feito de caule, sanduíche em que o pão foi substituído por duas folhas desidratadas de couve e recheado com um tartar verde indecifrável. Claro, eles sempre nos apresentavam os pratos com uma explicação detalhada, mas lá pelo quinto você honestamente já esta atrapalhado com tanto ingrediente novo, tanta receita elaborada, e não presta mais atenção.
O Noma preza por preparos e ingredientes locais, valoriza esse cuidado sustentável: sua cozinha deve usar produtos que estejam próximos a ela e que reforcem a cultura local.
Do ponto de vista gastronômico, considero a visita como algo que leva uma pitada de experiência antropológica. Saímos de lá – embora satisfeitos – com a sensação de que não nascemos mesmo para essa cozinha mais elaborada. Tudo ali parecia carregado de pensamento, e me deu saudade da macarronada da avó, simples mas cheia de paixão. Me pareceu uma cozinha muito técnica. Certamente pessoas mais ligadas às novidades gastronômicas saberão apreciar o que para mim possa parecer um mero virtuosismo gastronômico e o desfile de técnicas intrincadas de preparo de alimentos.”